† Fábio Silvério φ

Rapaz, eu li com aquela apreensão de "católico atento às possíveis heresias". Ia percorrendo as páginas, todo receoso. Mas para quem já simpatizava com Eckhart, foi tranquilo. Me motivei a lê-lo depois que vi umas pessoas do forms falarem disso. Bem, o que achei? Confesso que gostei, no geral.

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Algumas coisas me pareceram muito obscuras e não simpatizei nada com umas idéias ou outras. Mas no geral, gostei. Veja esses trechos sensacionais:

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"Esse é, em verdade, o momento e o lugar corretos do combate, isto é, diante da Luz de Sua Face. Se te manténs firme, se não te desvias, verás e sentirás grandes maravilhas. Descobrirás Cristo combatendo o inferno dentro de ti, fazendo em pedaços as tuas bestas, e fazendo surgir em ti um grande tumulto e uma grande miséria. Teus pecados secretos serão os primeiros a despertar, e tentarão separar-te de Deus. Verás e sentirás, então, como a morte e a vida lutam uma com a outra e, pelo que se passa em ti, entenderás o que são o céu e o inferno.

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Mas não te movas por isso; mantém-te firme e não te desvies. Por fim, todas as más inclinações se tornarão fracas e começarão a morrer, e tua vontade se tornará cada vez mais forte e capaz de submetê-las. Então, gradualmente, tua vontade e tua mente ascenderão ao céu, e tuas más inclinações perecerão. Obterás uma mente nova e, despojando-te da deformidade bestial e recobrando a imagem divina, começarás a ser uma nova criatura. Assim te libertarás de tua presente angústia e chegarás novamente ao repouso."

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"Se, ao menos uma vez, o Fogo do Amor acender-se em ti, sentirás seu ardor consumir rapidamente toda tua egoidade, e arderás em tal regozijo em seu Fogo que não desejarás, por nada neste mundo, estar fora dele. Sim!, preferirás a morte a retornar a teu algo. Então esse Fogo se tornará cada vez mais quente, até cumprir perfeitamente sua missão com respeito a ti, e portanto não arrefecerá até alcançar o sétimo grau. Quando chegar a esse ponto, sua chama será tão grande que nunca te abandonará. Mesmo que te custe a vida temporal, ele te acompanhará na morte com seu doce calor, e se tivesses de ir ao inferno, ele destruiria o inferno por ti. Estejas certo disso, pois o amor é mais forte que a morte e o inferno."

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Bem, eu também tenho uma certa apreensão quando vejo alguém se autodenominar tomista ou neotomista, não por causa da Filosofia Tomista, que muito estimo e na qual pretendo seguir, mas por causa de uma certa banalização de Sto Tomás que meio que coincide com uma certa banalização da apologética católica atual.

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O que acontece é que tem surgido um monte de pretensos filósofos que leram uma coisa ou outra de Sto Tomás e já acham que aquilo é suficiente para refutar qualquer coisa que não seja Sto Tomás (Não estou falando do Sidney, por favor..). Ora, isso é meninice. Porém, há gente que tem pressa de brilhar. E esse negócio de Tomismo é uma coisa que dá status, principalmente em alguns meios. Ora, isso é um prato cheio pra vaidade. É triste, mas é possível acontecer que alguém se torne "tomista" pelo mesmo motivo que um neófito universitário se torna comunista, isto é, por carência afetiva, por desejo de ser estimado pelos outros. A vaidade pode ser, inclusive, um motivador suficiente para toda uma vida externamente católica. Externamente, entenda...

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Vê, por exemplo, o atual nível da maior parte da apologética atual: despreparo, agressividade, extrema susceptibilidade, irresponsabilidade. Será que aquilo é feito, de fato, por amor à Igreja, ou será que a Igreja aí é só um pretexto? Na verdade, nós não podemos julgar as intenções de uma pessoa em particular. Mas, avaliando genericamente: ninguém é inocente, né?

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Sobre esses neo-tomistas atuais, tem gente que refuta a priori qualquer Filosofia que não seja a tomista. Ora, desde quando Filosofia se tornou dogma, assim? Filosofia é argumentação! Se o sujeito não sabe defender satisfatoriamente uma posição filosófica, ele não pode simplesmente encerrar a questão ao dizer: "Ah, Sto Tomás diz isso." Essa seria uma atitude que o próprio Tomás reprovaria.

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Sobre o Sidney - porque senão não sobra espaço -, quem me dera ter um terço do preparo que aquele rapaz tem. Há, de fato, a meu ver, certas posições excessivas e alguns erros que, vez ou outra, eu julgo ver. Certas confusões. Mas o cara é muito bom. Ênfase no 'muito'.

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Não sei em que sentido tu te referes a esse "esquecimento do mundo real". Seria um tipo de argumentação que fale tanto dos princípios metafísicos que chega a desdenhar as realidades do aqui e agora? Bem, se observares, a filosofia tomista é uma filosofia essencialmente realista. Se tua crítica é à Filosofia em si, talvez não estejas alcançando certos conceitos. Talvez, eu disse. Se é, ao invés, uma crítica à existência da realidade espiritual, fica sabendo que ela é mais densa e real do que essa realidade atual. Isso aqui é passageiro e evanescente. Lá é que as coisas possuem maior substância e é para lá que todos nos encaminhamos. Lá, rigorosamente falando, é que é o mundo real.

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Bom dia.

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Fé e Razão são ambas dadas por Deus. Só por isso, elas já não poderiam ser opostas.
A razão busca, naturalmente, conhecer. Porém, ela não é ilimitada. Há certas coisas que ela não alcança. E, contudo, o motivo da nossa existência é conhecer, amar e servir a Deus. A razão natural pode nos dar alguma notícia de Deus, da sua existência, mas não nos diz absolutamente nada sobre a sua personalidade, sobre Quem Deus é. S. Paulo diz que Deus se dá a perceber a partir das suas criaturas visíveis. Ou seja: chegamos à constatação da Sua existência e de certos atributos Seus pela razão natural, mas não podemos dizer muita coisa sobre os Seus planos, a Sua vontade, etc.

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A Fé, embora seja um conhecimento obscuro, isto é, não nos dê a constatação empírica e evidente dos seus objetos, nos permite conhecer aquilo que está acima das nossas possibilidades naturais de verificação. Neste sentido, ela é supra-racional, mas nunca foi anti-racional. Isto quer dizer que ela está acima da razão, e não contra ela. Uma atitude de fé natural é requerida já no exercício comum das nossas faculdades. Quando nós dizemos que a nossa razão é capaz de conhecer alguma coisa, o que fazemos é um ato de fé na razão. Como provar que a razão pode conhecer? Qualquer prova já se dará pelo uso da razão, e, por isso, já terá por pressuposta a sua capacidade cognoscitiva, isto é, de conhecer. O mesmo ato de fé se exige com relação aos nossos sentidos. E, no nosso dia a dia, estamos sempre depositando nossa fé em várias pessoas: no motorista que nos leva ao destino esperado, na mãe ou esposa que traz o suco de laranja e nós cremos que aquilo não está envenenado, etc.

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A Fé que tem a Deus por objeto - especificamente a Fé católica -, no entanto, não pode ser reduzida a essa mera confiança natural. Ela é um dom de Deus, o que significa que nós não poderíamos criá-la por nós mesmos. Deus a dá e nós a recebemos. Para tê-la, necessitamos ouvir uma Doutrina específica e obedecê-la. "A Fé vem pelo ouvir". Obedecer, do latim 'ob audire', significa submeter-se ao ouvido. Mas para obedecer, precisamos, antes, entender. Por causa dessa relação, diz-se que a Fé é uma virtude infusa - porque dada diretamente por Deus - e intelectual - porque age primeiramente no intelecto nos facilitando a compreensão das verdades da Fé. No entanto, a Fé compromete a pessoa inteira, já que, depois de ser entendida, ela exige o assentimento também da vontade.

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João Paulo II, na Fides et Ratio, compara a Fé e a razão a duas asas que nos elevariam para Deus. Contudo, essa figura costuma ser objetada porque passa a impressão de uma igualdade valorativa entre razão e Fé. Para o católico, porém, a Fé é conhecimento mais perfeito e seguro - porque diretamente revelado por Deus - e, portanto, é superior. O fato de ser obscura não se deve à sua pouca luz, mas ao excesso de luz. Do mesmo modo, ficaríamos ofuscados se estivéssemos diante do sol.

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