Rs É legal porque essa linguagem metafísica é um ponto de encontro fortíssimo entre a tradição grega e a tradição bíblica. Quando Deus diz a Moisés que Ele é o que é, um grego ali teria achado aquilo familiar. É a linguagem de Parmênides. Depois, Jesus vai usar essa mesma terminologia, em vários momentos. Um ponto a que pouca gente atenta, mas que sempre me fascinou, é aquele momento em que vão prender Jesus, e Este pergunta: "Quem vocês procuram?", ao que os soldados respondem: "A Jesus de Nazaré". "Sou eu", Ele diz, que é o equivalente a "Eu sou" (Ego Eimi). E os soldados, não podendo suportar a pressão deste nome, caem.
O que faz sentido é aquilo que se adéqua aos nossos pressupostos, à nossa ideia, à nossa cosmovisão. Em resumo, é aquilo que está do nosso tamanho. Os planos divinos nem sempre nos fazem sentido - a não ser depois que as coisas se completam - porque nos ultrapassam. Assim, o grosso da realidade é o mistério.A nossa vontade nos inclina para coisas que não são muito definidas. Temos vontade de ser felizes, santos e de fazermos coisas grandiosas, que transitem pelo auto-sacrifício, mas não temos muita ideia de o que é isso, exatamente, e de qual é o caminho. É como se a nossa vontade adivinhasse ou intuísse um objeto que ainda é obscuro para a inteligência.Então, aquilo que cabe na nossa inteligência nem sempre satisfaz a vontade. A vontade se torna uma espécie de bússola para saibamos distinguir, para além da razão, o que é autêntico e o que não o é. Ela nos fornece a direção. É como uma nostalgia de alguma coisa que nos é, ao mesmo tempo, estranha e familiar.
Eu não sou o não-ser, que não é, nem o Ser, que é o único que é. Eu sou um meio termo, misto de ser e não-ser. Existo, mas não em mim mesmo. Minha existência radica no Ser, que é Deus. E eu existo neste Ser desde sempre. Sou, assim, de alguma forma, eterno, mas por participação.
Como alguém só é ruim na medida em que é livre, essa pergunta versa sobre o velho problema da liberdade.Até que ponto somos livres para sermos o que somos? Muito do que nós somos não foi nossa escolha: nosso gênero (que só existem dois), nossa orientação sexual, nosso Dna, nossas predisposições afetivas, nosso temperamento, nossos instintos, nossa inteligência, etc. Isso tudo nos é dado. E o que sobra? Sobra um algo aí que nos permite a faculdade de decidir o que fazer com isso tudo. Esse algo, contudo, que é a liberdade, é feito de inteligência e vontade. A primeira, que, conforme dito, nos é dada, embora possa ser um tanto desenvolvida ou embotada de acordo com as circunstâncias, quanto mais aguda for, mais nos permite compreender as situações e o que está em jogo. Essa compreensão é fundamental para que alguém seja livre e, portanto, culpado do mal. Se a pessoa não entendeu o que tava em jogo, como poderá ser julgada? É por isso que pessoas com problemas mentais não podem responder devidamente por um crime, a depender, claro, do grau do problema. E a vontade, que é a capacidade de decidir, é mais férrea em uns, e mais mole em outros, e essa sua disposição, embora possa ser treinada, também é, em boa parte, recebida. Há, contudo, uma tendência geral ao relaxamento, de modo que o desejo assume o lugar da vontade e esta vive, desde então, de apenas ceder. Cada um vai operando segundo as suas tendências naturais, e a coisa entra num hábito, num vício, do qual quase ninguém ousa sair até por falta de repertório, já que todo mundo faz quase o mesmo.Além do que nos foi dado, outra boa parte é fruto dos nossos condicionamentos. É por isso que pessoas legitimamente maliciosas, isto é, que optam livremente pelo mal, embora existam, eu penso que não sejam tão comuns.
Seres humanos são animais e também trabalham com isso de marcar território. Então, quando há um outro macho por perto, interessado naquilo que a pessoa demarcou, é normal que se sinta a ameaça. Não é uma sensação boa, mas dá pra evitar que ela surja desde o começo. Se a pessoa não tiver a devida atenção, fica possuída e já era.